quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

CORRENDO ATRÁS DE PAZ

Hoje tentava ler um livro em casa, mas a cadela do vizinho perturbava tanto que resolvi pegar a bicicleta e fui até o emissário. Como não há árvores no local - acho que os iluminados que bolaram aquilo não gostam de árvores - sentei-me sob a obra da Tomie Ohtake, único local com sombra. Em cima, a obra, e, no subsolo um rio obrado. Algumas moças de Cubatão conversaram comigo e quiseram saber do emissário. Mostrei-lhes o amontoado de prédios visíveis na orla da praia explicando-lhes que, além daqueles, todos os prédios e imóveis da cidade têm ligação direta com o emissário, porque todos os detritos produzidos acabam passando sob o local onde estávamos. Também disse-lhes que, do jeito que continuam construindo tantos prédios enormes, há o risco de uma explosão de metano que poderá fazer com que a obra de Ohtake vá parar na África.
Elas riram e uma delas se queixou da falta de árvores. Lembrei de um disco do Vandré, produzido na época da ditadura. No verso, uma frase de Bertolt Brecht: "Nestes tempos em que falar de árvores é quase um crime, pois implica em silenciar aos que virão depois de mim". Talvez a frase explique as razões de certas figuras detestarem árvores. Vejam como a mente viaja...

sábado, 7 de novembro de 2009

A POESIA EM "TERRA EM TRANSE"

Certa vez fiquei emocionado ao ler matéria de Janio de Freitas elogiando a poesia em "Terra em Transe", de Glauber Rocha. Foi uma das coisas que mais me chamou à atenção ao ver o filme, que Maurice Legeard programara. Maurice também se impressionou muito, pois, além de tudo que Glauber inseriu no filme, de social e político, com todas as mazelas e nuances, ainda colocou na voz grave com estranha conotação trágica de Jardel Filho vários monólogos poéticos, como o já aqui publicado "Quando eu voltei para Eldorado..." demonstrando que a obra de Glauber não perde a atualidade. Outro grande jornalista com quem tive grande prazer em conversar foi Zuenir Ventura, e acabamos abordando também a poesia em "Terra em Transe", e é citada em seu excelente livro "1968 - O QUE FIZEMOS DE NÓS", no capítulo em que ele conversa com Heloísa Buarque de Hollanda. Ela cita frase do diálogo poético entre Paulo(Jardel Filho) e Sara (Glauce Rocha) num momento dramático do filme, que reproduzo abaixo, mostrando inclusive "os dias de trevas que vieram depois", citação que está também quase no final. Volto a lembrar que "Terra em Transe foi rodado em 1966/1967.

Paulo: - Mas eu recuso a certeza, a lógica, o equilíbrio! Eu prefiro a loucura de Porfírio Diáz!
Sara: - Assim é tão fácil...
Paulo: - Fácil... rompendo com tudo e com todos... sacrificando as mais fundas ambições...
Sara: - O que sabe você das ambições? Eu queria me casar, ter filhos, como qualquer outra mulher... eu fui lançada no coração do meu tempo. Eu lavantei nas praças meu primeiro cartaz. Eles vieram, fizeram fogo, amigos morreram... me prenderam... me deixaram muitos dias numa cela imunda... com ratos mortos... me deram choques elétricos, me seviciaram e me libertaram... com as marcas. E, mesmo assim, eu levei meu segundo, terceiro e sempre cartazes e panfletos e nunca por orgulho. Era uma coisa maior, em nome da lógica de meus sentimentos. E se foram as ambições normais de uma mulher normal. De que outra ambição posso falar que não seja de felicidade? Tendo pessoas solidárias e felizes?
Paulo: - A fome do absoluto...
Sara: - A fome...
Paulo: - Eu tenho esta fome! Vem comigo, Sara! Não fique como os fanáticos, à espera das coisas que não acontecem antes que nos acabemos! Vem comigo! A vida está acima das horas que vivemos! A vida é uma aventura...
Sara: - Você não entende... um homem não pode se dividir assim... a política e a poesia são demais para um só homem... eu gostaria que você ficasse conosco. Volte a escrever.
Paulo: - Não anuncio cantos de paz
Nem me interessam as flores do estilo (ao fundo, trecho suave
Como por dia mil notícias amargas de Villa-Lobos)
Que definem o mundo em que vivo.
Ah, Sara... (beija-a)
Sara: - Não me causam os crepúsculos
A mesma dor da adolescência
Devolvo tranquila à paisagem
Os vômitos da experiência...
Paulo: - A poesia não tem sentido... palavras... as palavras são inúteis...

O nome "Porfírio Diáz" faz alusão a um dos generais da revolução mexicana, oposto a Pancho Villa. Glauber, no filme, misturou nomes de língua portuguesa com outros de língua espanhola, caracterizando "Terra em Transe" como um filme continental, com todos os problemas comuns às
Américas Latinas. O acento em Diáz foi colocado pois foi assim pronunciado por todos os personagens por dar mais força ao nome. Glauber escrevia os textos tendo na cabeça as conotações das vozes de seus atores, e no caso de Jardel Filho, com sua voz privilegiada, as palavras ganhavam mais força, fluíam de forma trágica e impressionante.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

NO FUNDÃO

No Fundão (*)

Após o azul da tarde
Logo anoitecia no Fundão.
A sombra chegava primeiro
e nos envolvia nas tardes de inverno.
O som vinha do britador,
das explosões na pedreira.
À noite, quando chovia,
a sinfonia dos sapos se fazia ouvir.
Em junho, balões
se misturavam às estrelas,
que ainda estão aí nos observando,
apesar da poluição.
Os bailes do Vila Atlântica,
as namoradas,
os bêbados na padaria Nova Era,
no Bar Madeira, no Empório São Judas Tadeu.
Os parques de diversões,
onde oferecíamos canções a moças bonitas.
Em março de 1956, a tragédia.
A avalanche derrubou casas e matou muita gente pobre.
Hoje olhamos o Fundão e as recordações doem.
O tempo levou muitos,
deixou outros tão mudados.
Alguns, nem tanto.
Só a saudade é sempre renovada.

(*) Fundão é como chamávamos o final da rua Carvalho de Mendonça,
onde começava o morro do Marapé. Ali existia a sede do Vila Atlântica F.C.,
a Pedreira Atlântica, durante uma época o Circo Teatro Irmãos Almeida, o parque de diversões do Coronel Arruda, o Gran Circo Prata. O nome "Fundão" é atribuído à autoria de Álvaro de Andrade (Né) possuidor de cerca de 300 fotografias tiradas de 1949 até os anos 1960.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

MAURICE E O FILME 'VAMPIROS DE ALMAS'

Maurice, após muitos anos instalado na av. Ana Costa, saiu de lá para a rua Pará nº 98, depois seu acervo foi parar num depósito, mais tarde instalou-se no Teatro Municipal. Obrigado a se retirar dali, foi convidado pelo SESC, na av. Conselheiro Nébias, onde ficou instalado durante cerca de cinco anos. Exibia sessões com filmes em 16mm, e muitas vezes as cópias não vinham em bom estado. Foi assim que aconteceu com o filme "Vampiros de Almas" (invasion of the body snatchers) de 1956, com direção de Don Siegel, que causou muita polêmica por ocasião de seu lançamento. Os americanos diziam que era uma sátira à vida na União Soviética e estes, que era uma sátira ao capitalismo. Seres extraterrenos eram criados dentro de favos, exatamente iguais a seres humanos que seriam substituídos enquanto dormiam, só que perdiam qualquer forma de sentimento, como se não tivessem alma.
O diretor Don Siegel foi obrigado a terminar o filme, por imposição do sistema, com o personagem principal sendo atendido pelas autoridades para conter a invasão. No final original, o filme terminava com ele na estrada gritando aos veículos que não seguissem, sem solução para o planeta. O filme veio de São Paulo com o final cortado, e acabou ficando fiel à concepção do diretor. Maurice sabia, mas ficou quieto. Até estas coisas curiosíssimas aconteciam nas sessões do Clube de Cinema...

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

ELOY - Poemas originais















Estou insistindo em publicar - insisto e sou teimoso - em pelo menos dois poemas de Eloy Corrêa de Oliveira Neto, como ele os concebeu, já que a máquina os deformou. Seguem também alguns desenhos e fotos.












domingo, 27 de setembro de 2009

Noca CAGADA!

Amigos, saiu errado novamente. Informaram-me que digitando na página do blog, sairia certo. Outra vez o computador deturpou a configuração dos dois poemas. Desculpem.
V
V E
V E R
VER ALI
VER ALICE
V E R A L I C E
VER A VELHICE
V E R A L I C E
VER ALICE
VER ALI
V E R
V

O Poema "VERALICE" como foi concebido por Eloy.
Abaixo, "FETO"


Feto a feto:

feto.

Feto co fetos...


fetos infe tos.

c

DESENHOS DE ELOY




Quero mostrar dois desenhos de Eloy.

sábado, 26 de setembro de 2009

ELOY CORRÊA DE OLIVEIRA NETO (CAPIBA)
Conheci Eloy em 1967, graças a meu amigo Juracy Silveira. Eloy fazia parte de um grupo que se encontrava no atelier do Jura, e que funcionava como ponto de encontro da turma. Além de Juracy, Eloy, faziam parte do grupo Maurice Legeard, Vasco Oscar Nunes, João Carlos Batista, Reginaldo Cavalcanti, Floreal, Zoé, e eventualmente apareciam Beatriz Rota-Rossi, Luiz Hammen, Luis Garcia Jorge.
Eloy gostava de poesia concreta, Drummond, Augusto dos Anjos e foi ele quem me “apresentou” a esses gênios. Sob essas influências e sua visão crítica e imediata das coisas, produzia seus belos trabalhos.
Eloy se ligava em certos detalhes, como a palavra “irreversível”, muito usada pelos militares em relação à “redentora”, e tinha a intenção de produzir um texto usando esses termos criados pelos “revolucionários” de 1964. Ganhou o apelido de Capiba – que assinava KPiba (O “PI” era aquele símbolo matemático), por causa do rio Capiberibe e de outro Capiba, também pernambucano – e de Garibaldi, por chamar assim a várias pessoas, principalmente a mim.
Pretendia reunir em livro seus trabalhos, usando o pseudônimo de “ECON” – suas iniciais – mas dificuldades impediram que o realizasse.
Íamos sempre ao cinema, principalmente às sessões de meia noite no cine Roxy, programadas por Maurice, que coordenava o Clube de Cinema de Santos, e ouvíamos música, líamos muita poesia, era uma época, apesar do golpe recente, de muita criatividade, discussão política, com toda a repressão, censura e alcagüetes que se multiplicavam como ratos, principalmente na refinaria de Cubatão, onde trabalhávamos. Minhas filhas, pequenas, o adoravam, chamava Geórgia, a mais nova, de “ Bábi” e, em vez de beijá-las, dava um cheiro em seus cabelos, o que divertia Roberta, a mais velha.
Eloy era íntegro, muito franco e explosivo. Tinha respostas sempre prontas, espirituosas. Eu também freqüentava sua casa e fiquei muito amigo da família, o Pastor Eclésio, da Igreja Batista, a mãe, dona Isabel, os irmãos Iracema, Lutero, Marcos e Nina, a caçula. O pastor gostava das piadas que eu contava, ria muito, era muito culto, era poeta e pintor, reproduzia fielmente os engenhos de açúcar de Pernambuco, de onde vieram. Preparava um livro, “Nordeste, a Terra e o Homem” ilustrado por ele. Eloy herdou dele certa habilidade para o desenho. Um dos poemas que conheci do pastor se chamava “A Língua”, e gostei tanto, que nunca mais esqueci. Uma gente simples, amiga, verdadeira, com quem me identifiquei muito. Eloy deixou o evangelho e entrou para o Partido Comunista, uma guinada de 180º com todas as implicações que aquilo significava naqueles férteis anos 60. Mas não se afastou da família, amava-os com muita dedicação e era seu esteio, pois tinha um bom emprego. Quase todos tinham certa deficiência auditiva, Eloy ouvia mal de um dos ouvidos e lembro que quando tomávamos condução ele sentava com o ouvido bom a meu lado, para me ouvir melhor. Achava que uma revolução brasileira começaria pelo nordeste. Alguns acidentes seguidos na refinaria fizeram com que deixasse a Petrobrás. Casou-se com Ana Lúcia, que morava em Santo André, e foi morar naquela cidade. A distância, o trabalho, fez com que nos víssemos pouco. Ele veio a Santos para uma das homenagens a Maurice Legeard, morto em 1997. Trouxe aos amigos uma coleção que deu o título “Pensando Pensamentos”, em maio de 1998, com textos de Walt Whitman, Roger Garaudy(vários), Aragon, Manuel Bandeira, Mahabharata e até Jesus Cristo. Depois contraiu diabetes, nos últimos anos teve isquemia cerebral, sofreu cirurgia cardíaca e faleceu em 12 de abril de 2008, três dias depois que fui operado do coração.
Os trabalhos que se seguem ficaram numa pasta que deixou comigo, e é para que se tenha uma idéia de sua forma de ver o mundo, as pessoas, as contradições. Eu teria mais histórias, muitas engraçadas, para contar de Eloy, mas ficarão para mais tarde. Em meus registros contei cerca de 110 idas ao cinema, fora peças de teatro, como “Hair”, a apresentação de Paulinho da Viola no cine Caiçara e outros espetáculos.

Argemiro Antunes - MIRO
UM RAPAZ DE FUTURO – 1968

Não era em vão
De d. Flora
A preocupação.
Noite a dentro
Fazia o amor
Para do ventre
Brotar uma flor

Como mulher que se preza
Empolgada com a missão
A náusea suportou
Agüentou a gestação
Hoje Mater Et Magista
Por amor a João

Veio o dia
D. Flora floresceu.
Mariquinha já cresceu;
Sua eterna esperança
Sua própria extensão

Nas pegadas da menina
O gaiato apareceu;
Logo veio a indagação:

“É rapaz de futuro,
Dá duro o vilão?”

Amante, sonhadora
Mariquinha logo acode:
“Não, Não dá o duro
Trabalha com parafina
Tem as mãos finas
Mas é rapaz de futuro

Nasceu nos anos cincoenta
Os anos setenta alcançou
É rapaz de futuro
Amanhã será um doutor.

Gerismundo é seu nome
O futuro já o cercou
Tem uma ninhada de filhos
Asma brônquica e ANADOR
Tem “bicos de papagaio”
“papagaios” a pagar
E pra não sair da rotina
Parafina a fabricar...
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MARIA - 1967

(Eloy disse que se inspirou enquanto
Esperava o ônibus da Petrobrás e passou
Outro ônibus, escrito ALBA S.A., que
Também é um nome de mulher)

MARIA DE JESUS
MARIA DAS GRAÇAS
MARIA DOS PRAZERES
MARIA JOSÉ
DE JOSÉ
DE ANTÔNIO
MARIA DAS MERCEDES
DOS MERCEDES
MERCEDES BENZ
CHEVROLET
FORD
MARIA DA GLÓRIA
MARIA DAS DORES
MARIA DO SOCORRO
MARIA DE SÁ
MARIA SÁ
MARIA S.A.
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ALGUÉM


ELA ALGUÉM, A QUEM

SE AMA

ELA ALGUÉM, A QUEM

SE QUER

EU ALGUÉM,


AQUÉM...


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A PEDRA DE CADA DIA



Eloy quer casar...
Fulana quer casar...
Mas as pedras não se transformam em pão.
Nem de pedra vive o homem.

VAI NAMORAR


Vai namorar...
Não é nada de mais...
Também nada de muito... dizem
Muitos que em amor...
Afogaram as almas em POÇOS DE CALDAS, em Minas Ge-
rando amor...
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AMOROSOS


Amorosos vão amar...
que amar -
gar...
amar -
gurar...
Vão amorosos amar...
Neste amor que se tem
Com prece... com tudo...
contudo
amortece...
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TRISTEZA DO MONO-AMAR



Por que amei,
e o mono amei...
neste amar, enamorar e mono-amar?...
Por que amei e não poligamei?
Por que vivi...
Vivi o mono, o monótono...
Tristeza do mono-amar?
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MINHA ROSA


Passou.
O tempo passou...
era rosa,
flor-rosa...
formosa.
Veio o asco...
E a rosa já não é rosa,
é asquerosa.
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FETO


Feto a feto:
afeto.

Feto co fetos...

fetos infe tos.
c

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MENINA BOBA


Que menina boba...
menina pedante!
Anda de ônibus, salta de
ônibus...
oni –
potente quer ser...
salta,
não me olha,
não me vê...
vai menina

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MURMÚRIO


Como olhar o mar, salgado mar... mar-
tírio...
Como olhar o mar e os mar –
tires...
mortos no mar...

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DESPERTA



Desperta!
Estás no crime, no mundo...
estás junto adjunto...
Desperta adjunto, caro ad...
ardes junto no Hades...

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NAMOREI


Namorava (Eu),
Era ela Maria.

Namorava (Eu),
Era ela Tereza.

Namorava (Eu),
Era ela fulana...

Namorei...
sou Elo y...

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OS VELHOS


Olhem os velhos!
Olhem os velhos!
Como olham
os tempos,
os templos...
olhem os velhos...
olham a hora, a hora... e
aorta à hora em que entor-
ta.

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O CUSPO



O cuspo

O cupido

O cuspo

O cupido

cuspo
cupido



cuspido


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AMOROSOS


Amorosos vão amar...
que amargar...
amargurar!

Vão amorosos amar...
neste amor que se
tem com prece...
com tudo
amortece
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V E R A L I C E




V

V E

V E R

VER ALI

VERALICE

VER A VELHICE

VERALICE

VER ALI

V E R

V E

V










Todos os poemas deveriam pertencer a um
trabalho, com o título de “HUMANADOS’,
e o pseudônimo de ECON, iniciais de “Eloy
Corrêa de Oliveira Neto (8.7.1944-12.4.2008)
Veio para Santos em 23.6.1960.
Os poemas foram escritos em 1967/1968.




A LÍNGUA

Eclésio Corrêa de Oliveira (4.7.1914-12.8.1978)

Certo viajor, em longa caminhada
Atravessava uma região serrana
Como quem busca o ideal sem gana
Indiferente ao rumo da jornada

No desagravo desta vida insana
Desprezando o ardor da sorte herdada
Encontra, com surpresa, junto à estrada
Um arcabouço de ossada humana

Abandonado, envolto num mistério
Despreza a paz feliz do cemitério
Num ar sombrio de quem morreu à míngua

E o viajor, sem lhe saber o nome
Interpelou: Quem te matou? A fome?
E uma voz sumida respondeu: A língua

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

MAURICE E EU NO DIA DO AI-5

No nefando dia 13 de dezembro de 1968, dia em que foi decretado o AI-5, Maurice e eu estávamos no cine Indaiá - também assassinado - a convite do Sr. Francisco Campos, dono da empresa CINEMAS DE SANTOS LTDA., assistindo ao filme "DE PUNHOS CERRADOS" (I Pugni in Tasca), de 1965, direção de Marco Bellocchio. Nessa mesma sessão, que começou à meia noite - estavam dois estudantes, Max e Clóvis, que acabavam de sair da prisão, acusados de fabricar coqueteis "Molotov" no Centro dos Estudantes. Terminado o filme, fomos ao restaurante "Ponderosa", na esquina da Tolentino Filgueiras com Ana Costa, que era o ponto de encontro do pessoal ligado ao Clube de Cinema de Santos, que Maurice coordenava, assim como os alunos da Faculdade de Direito e demais pessoas ligadas à cultura na cidade. A notícia da decretação já se espalhara, já dava para sentir certa apreensão nas pessoas que lá estavam. Era a GRANDE NOITE que se iniciava sem previsão para terminar. Zuenir Ventura descreve o episódio com maestria em "1968 - O ANO QUE NÃO TERMINOU"sobre aquela época terrível.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

A ATUALIDADE DE 'TERRA EM TRANSE'

Este texto pertence ao filme "Terra em Transe"(1967), de Glauber Rocha. É impressionante como se mantém atual.
Quando eu voltei para Eldorado,
Não sei se antes, ou depois...
Quando revi a paisagem imutável, a natureza...
A mesma gente perdida
Em sua impossível grandeza...
Eu trazia uma forte amargura dos encontros perdidos
E outra vez me perdia
No fundo dos meus sentidos...
Eu não acreditava em sonhos e mais nada
Apenas a carne me ardia
E nela eu me encontrava.

O time dos tempos do ginásio.